São múltiplos os arranjos familiares reconhecidos pela Constituição Federal, que têm como elo o afeto e a dignidade de seus membros. Não se mostra viável em uma sociedade multicultural distinguir os núcleos familiares pela sua orientação sexual. O que importa é que o pluralismo familiar recebe proteção do estado, em especial quando se casam, já que o instituto do casamento é um meio encontrado pelo estado de proteger o seu núcleo essencial: a família.
Ser diferente, no sentido de optar por ter uma orientação sexual diversa do habitual, é um direito que retrata um projeto de vida e concretiza o princípio constitucional da isonomia.
A igualdade, a não discriminação, a dignidade da pessoa humana, o livre planejamento familiar, são comandos constitucionais a albergar o direito de ser diferente. Uma sociedade livre, justa e igualitária não se coaduna com o preconceito que sofrem as pessoas do mesmo sexo que desejam se unir através do casamento.
Aliás, compulsando-se os artigos 1.514, 1.521, 1.523 e 1.565 do Código Civil, expressamente não se abstrai vedação ao casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Mas, por que tanto alvoroço? A realidade social deve atingir os olhos daqueles que interpretam os textos normativos existentes, dando-os uma interpretação conforme a Constituição da República Federativa do Brasil, que desde 1988 protege o direito de ser diferente. Não se pode vincular a visão religiosa à visão jurídico-social. Lembre-se de que o Brasil é um estado laico (artigo19 da CF/88).
Dentro deste contexto de proteção, a egrégia Corregedoria Geral da Justiça do Estado do Espírito Santo – CGJ/ES, com o fim de orientar os Cartórios do Registro Civil das Pessoas Naturais, através do Ofício-Circular nº 59/2012, de lavra do eminente Desembargador Carlos Henrique Rios do Amaral, recomenda que os oficiais do registro civil de pessoas naturais unifiquem o procedimento de habilitação para o casamento civil, nos termos da legislação aplicável aos casamentos heteroafetivos, sendo incabível qualquer distinção no procedimento em razão do sexo dos nubentes.
No sentido de densificar os princípios constitucionais já mencionados, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) expediu uma resolução pacificando a questão. Trata-se da resolução nº 175, de 14 de maio de 2013, que dispõe sobre a habilitação, celebração de casamento civil, ou de conversão de união estável em casamento, entre pessoas do mesmo sexo.
O Conselho Nacional de Justiça alinha-se ao decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na ADPF 132/RJ e na ADI 4277/DF, na medida em que “veda as autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo”. E determina que a recusa implicará “imediata comunicação ao respectivo juiz corregedor para as providências cabíveis”. Em seus “considerandos”, o Conselho Nacional de Justiça esclarece que as decisões do Supremo Tribunal Federal, nos julgamentos prolatados nas ações acima, foram “proferidas com eficácia vinculante à administração pública e aos demais órgãos do Poder Judiciário”.
Em virtude do efeito vinculante dos mencionados julgamentos do Supremo Tribunal de Federal, o Conselho Nacional da Justiça expediu a Resolução 175/2013. Assim, o direito alcança o fato social e nenhum obstáculo mais existe para que pessoas do mesmo sexo se casem em qualquer lugar do Brasil.
FERNANDO BRANDÃO COELHO VIEIRA
OFICIAL DO 1º REGISTRO CIVIL DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM-ES