Jurisprudência TJ-SP - Decisão em Matão (SP) declara inexigível a incidência, na base de cálculo do ISSQN, de verbas referentes às indenizações recebidas pelo Fundo de Compensação dos Atos Gratuitos
Publicado em 30/07/2014
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
COMARCA DE MATÃO FORO DE MATÃO 3a VARA CÍVEL SENTENÇA Cautelar Fiscal - Anulação de Débito Fiscal Cartório do Registro Civil de Matão/SP. e outro Fazenda Pública do Município de Matão VISTOS. Juiz(a) de Direito: Dr(a). Gustavo Carvalho de Barros CARTÓRIO DE REGISTRO CIVIL DE MATÃO/SP, e seu respectivo oficial ALBERTO SCARPA VARANDA, propuseram Ação Declaratória de Inexistência de Débitos Tributários c.c Anulatória de Débitos Fiscais com pedido de tutela antecipada contra FAZENDA PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE MATÃO alegando, em sÍntese, que a requerida tem lançado, ilegalmente, a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre os valores auferidos pelo autor a título de compensação pelos atos gratuitos realizados pela serventia. Sustenta que em razão da gratuidade de emolumentos para o registro civil de nascimento e pelo assento de óbito, bem como para a emissão das primeiras certidões respectivas e outras hipóteses, a lei estadual no 10.199/98 criou o Fundo de Compensação aos Oficiais de Registro Civil com o fim de indenizar os cartórios pelos custos decorrentes destes serviços gratuitos. Assim, como a natureza deste recurso é indenizatória (artigo 32, § 3o, da lei estadual no 10.199/98), não se confundindo com o preço do serviço, não há que integrar a base de cálculo para fins de incidência do ISSQN. Desta forma, requerem a procedência da ação para declarar inexigível a incidência, na base de cálculo do ISSQN, de todas as verbas referentes a indenização pelo Fundo de Compensação aos Oficiais de Registro Civil, desde o exercício de 2007; e a anulação e restituição dos valores indevidamente lançados e recolhidos a este título, desde 2007. Com a inicial, vieram os documentos (fls. 16/114). O pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi deferido (fls. 118), autorizando-se o depósito judicial dos valores devidos a título de ISSQN. A requerida foi citada e apresentou a sua contestação alegando a regularidade na cobrança do imposto, fundamentando na ADIn 3.089/STF, que autorizou a cobrança do ISSQN sobre os serviços cartoriais e notariais e que a receita auferida pela serventia decorrente do ressarcimento pelos serviços gratuitos prestados, constitui remuneração (preço do serviço). Impugnou, também, os demais pedidos (restituição, tutela antecipada, etc) e requereu a improcedência da ação. (fls. 129/134). Réplica a fls. 139/146, oportunidade em que os autores juntaram outro documento (parecer jurídico de fls.147/192). É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. O presente processo comporta julgamento antecipado, haja vista que a questão tratada é de direito e desnecessária a produção de prova em audiência. A presente ação merece ser julgada procedente. Inicialmente, nos termos do artigo 236 da Constituição Federal, vale frisar que os serviços prestados pelos requeridos são exercidos em caráter privado, mas concedido por delegação do poder público, senão vejamos: “Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público”. A Carta Magna, também, em seu artigo 5o, inciso LXXVI, letras “a” e “b”, prevê a gratuidade do registro civil de nascimento e da certidão de óbito para os comprovadamente pobres. Por sua vez, a Lei no 6.015/73, que trata dos registros públicos, estabelece em seu artigo 30: “ Art. 30. Não serão cobrados emolumentos pelo registro civil de nascimento e pelo assento de óbito, bem como pela primeira certidão respectiva. § 1o Os reconhecidamente pobres estão isentos de pagamento de emolumentos pelas demais certidões extraídas pelo cartório de registro civil. § 2o O estado de pobreza será comprovado por declaração do próprio interessado ou a rogo, tratando-se de analfabeto, neste caso, acompanhada da assinatura de duas testemunhas. § 3o A falsidade da declaração ensejará a responsabilidade civil e criminal do interessado. § 3o-A Comprovado o descumprimento, pelos oficiais de Cartórios de Registro Civil, do disposto no caput deste artigo, aplicar-se-ão as penalidades previstas nos arts. 32 e 33 da Lei no 8.935, de 18 de novembro de 1994. § 3o-B Esgotadas as penalidades a que se refere o parágrafo anterior e verificando-se novo descumprimento, aplicar-se-á o disposto no art. 39 da Lei no 8.935, de 18 de novembro de 1994. § 3o-C. Os cartórios de registros públicos deverão afixar, em local de grande visibilidade, que permita fácil leitura e acesso ao público, quadros contendo tabelas atualizadas das custas e emolumentos, além de informações claras sobre a gratuidade prevista no caput deste artigo. § 4o É proibida a inserção nas certidões de que trata o § 1o deste artigo de expressões que indiquem condições de pobreza ou semelhantes. Assim, pelo que se extrai do mandamento legal, as hipóteses de gratuidade de emolumentos e de emissão de certidões são de cumprimento obrigatório dos cartórios de registro civil. E, para remuneração dos oficiais de registro civil pelos atos praticados gratuitamente no cumprimento da lei, a Lei do Estado de São Paulo no 10.199/98 (artigos 31 e 32), prevê a forma e a fonte de Recursos que compõe o Fundo para o custeio destes atos gratuitos. Por sua vez, no Estado de São Paulo, é o SINOREG-SP (Sindicato dos Notários e Registradores do Estado de São Paulo) que administra o Fundo de Compensação, ou seja, recebe parte das custas que cabe ao Estado e repassa aos oficiais de registro civil. Também é certo e incontroverso que incide o ISSQN (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza) em face aos serviços prestados pelos cartórios extrajudiciais. Feitas estas preliminares considerações que entendo pertinentes, passamos a analisar se os valores recebidos pelos oficiais de registro civil (dentre eles os autores), à título de remuneração/compensação pelos atos praticados gratuitamente, devem ou não compor a base de cálculo do ISSQN. Embora o parágrafo 1o, do artigo 32, da Lei Estadual no 10.199/98 fale em “A remuneração dos oficiais de registro civil pelos atos praticados gratuitamente no cumprimento da lei...”, a verba repassada pelo SINOREG aos oficiais de registro civil tem natureza indenizatória, pois compensam os custos decorrentes dos atos gratuitos praticados. Neste sentido, é certo que do valor total cobrado pelos serviços prestados pelos registradores e notariais, há uma parcela que corresponde aos emolumentos do oficial, outra parcela que corresponde as custas do estado e, por fim, percentual referente as contribuições à Carteira de Previdência das Serventias Não Oficializadas, ale´m de outros encargos e contribuições instituídos por lei. Assim, a base de cálculo do ISSQN deve ser somente o valor dos emolumentos destinados ao titular da serventia, excluindo-se valores destinados a outros entes. E como os registradores e notários devem cumprir a lei na prestação de seus serviços, no que concerne a obrigatoriedade imposta pelo Poder Público para que determinados atos (serviços) praticados sejam gratuitos, nada mais justo que os oficiais sejam compensados com relação aos custos operacionais que tenham na execução destes serviços não remunerados. Assim, os Fundos de Custeio possuem a finalidade de dar efetividade e qualidade à prestação de serviços gratuitos pelos cartórios, pois preveem o ressarcimento (indenização) dos custos operacionais que os oficiais são obrigados a arcar. Em última análise, como tal verba possui natureza de compensação, não pode ser considerada como receita auferida pelo delegatário, não constituindo fato gerador do ISS, nem sua base de cálculo, pois tecnicamente não constituem preço dos serviços tributários. Neste sentido é a recente jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: “APELAÇÃO ¿ IMPOSTO ISS ¿ Incidência sobre serviços notariais e de registro Pretensão à tributação com alíquota fixa em função da natureza do serviço Descabimento ¿ Prestação de serviço de natureza pessoal não configurado - Serviço que é delegado ao notarial e ao registrador e que lhe proporciona contratar terceiros como se uma empresa fosse ¿ SINOREG - possui natureza de compensação, não podendo ser considerado como receita auferida pelo delegatário, na~o constituindo fato gerador do ISS, nem sua base de cálculo, pois tecnicamente não constituem preço dos serviços tributários. Base de cálculo do imposto que deve corresponder ao valor destinado ao Oficial titular da serventia extrajudicial, excluindo-se os demais encargos, com destinação diversa ¿ Ação parcialmente procedente - Sentença reformada em parte - Recurso do autor parcialmente provido”. (TJSP ¿ 14a Câmara de Direito Público ¿ Apelação no 0035595-98.2011.8.26.0576, da Comarca de São José do Rio Preto ¿ Rel. Des. Rodolfo César Milano ¿ v.u j. 10/04/2014) “RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA Sucessão tributária inexistente- Não aplicação do artigo 133 do CTN SINOREG- possui natureza de compensação, não podendo ser considerado como receita auferida pelo delegatário, não constituindo fato gerador do ISS, nem sua base de cálculo, pois tecnicamente não constituem preço dos serviços tributários. Recurso do autor parcialmente provido e recurso da municipalidade desprovido”. (TJSP ¿ 14a Câmara de Direito Público ¿ Apelação no 0002650-50.2011.8.26.0223, da Comarca de Guarujá ¿ Rel. Des. Rodolfo César Milano ¿ v.u ¿ j. 12/12/2013) Por fim, tem-se que a requerida não impugnou especificamente o valor indevidamente pago e que os autores entendem ser restituível. Enfim, a presente demanda deve ser julgada procedente em todos os seus termos, já que ilegal a incidência de ISSQN sobre as verbas recebidas do Fundo de Compensação aos Oficiais de Registro Civil. Ante o exposto e considerando tudo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a presente ação interposta por CARTÓRIO DE REGISTRO CIVIL DE MATÃO/SP e seu respectivo oficial ALBERTO SCARPA VARANDA em face da FAZENDA PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE MATÃO para, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil: a) declarar inexigível a incidência, na base de cálculo do ISSQN, de todas as verbas referentes às indenizações recebidas pelo Fundo de Compensação aos Oficiais de Registro Civil para custeio dos serviços gratuitos prestados pelos autores; b) por via de consequência, condeno a requerida a restituir aos autores, desde 31/12/2013 (fls.19), os valores indevidamente recolhidos/pagos de ISSQN que incidiram sobre as supracitadas verbas indenizatórias recebidas do Fundo de Compensação aos Oficiais de Registro Civil, que perfaz a quantia de R$ 6.141,46 (seis mil, cento e quarenta e um reais e quarenta e seis centavos), atualizados monetariamente e acrescidos de juros nos termos do artigo 1-F da Lei no 9.494/97, com a redação dada pela Lei no 11.960, de 29.06.2009. Por fim, confirmo a tutela antecipada concedida em fls. 118. Em razão da sucumbência, condeno a ré ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em 20% do valor dado a causa. Com ou sem recursos voluntários, oportunamente remetam-se os autos à E. Instância Superior, para o reexame necessário previsto em lei. P. R. I. C. Matão, 14 de julho de 2014. Fonte : Assessoria de Imprensa - Arpen-SP | ||
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