Em regra, o estado não responde pelos danos causados a terceiros por tabeliães e registradores — a não ser nos casos em que não é possível responsabilizar os verdadeiros culpados. Foi o que entendeu a 22ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro ao condenar o governo estadual a indenizar um homem intimado a pagar dívida tributária de uma empresa em que figurava como sócio.
O autor contou que foi intimado a pagar R$ 8,1 mil devidos por uma empresa de moda na qual aparecia como um dos proprietários. Ele constatou que foi incluído na sociedade em uma alteração do contrato social feita em 1981, no 23º Ofício de Notas do Rio de Janeiro. Porém, um exame pericial provou que a assinatura dele fora fraudada no procedimento.
A primeira instância, no entanto, julgou improcedente o pedido de indenização proposto pelo autor. É que os cartórios não têm personalidade jurídica, apenas formal, para fins de organização funcional — por isso, devem ter a ilegitimidade passiva reconhecida nas ações que visam a reparação por ato notarial e registral danoso a terceiros.
Segundo a sentença, em casos como esses, quem responde é o titular do cartório, ou seja a pessoa física, bacharel em Direito, que foi investido no cargo por meio de concurso público. O problema é que o atual responsável pelo 23° Ofício de Notas só o assumiu sete anos depois.
Com relação ao estado, a sentença afastou a responsabilidade por entender que esta seria subsidiária e apenas no caso de insuficiência ou insolvência do tabelião responsável pela lesão.
Inconformado, o autor recorreu. O desembargador Marcelo Buhatem, que relatou o caso, considerou acertada a decisão da primeira instância que absolveu o tabelião. “Com efeito, se a responsabilidade a que se submete o titular da serventia é de ordem pessoal, tendo o mesmo recebido a delegação mediante concurso de provas e títulos, na forma prevista constitucionalmente, sendo certo que ao cartório falece de personalidade jurídica, torna-se inconteste, até mesmo à míngua de previsão legal, não haver responsabilidade cartorial por mera sucessão, o que significa dizer que o titular da serventia não assume os atos danosos praticados por seu antecessor.”
No entanto, o relator não teve a mesma interpretação com relação à responsabilidade do estado. “Tem-se que a sentença apelada não enveredou pelo caminho mais correto ao concluir pela irresponsabilidade estatal, em razão da ausência de título judicial condenatório em desfavor do tabelião notário envolvido com os fatos (fraude), não sendo o caso, ademais, de insolvência deste último”, destacou.
Isso porque, na avaliação do desembargador, “restando inconteste a fraude perpetrada e o dano experimentado, não procede a argumentação de que a responsabilização do estado se daria somente na modalidade subsidiária”.
“Por uma questão de lógica, tal responsabilidade, por seu próprio nome, tem o condão de subsidiar uma responsabilidade principal que, na espécie, revela-se quase que materialmente impossível de ser configurada eis que imporia ao prejudicado perquirir, sabe-se lá onde, a pessoa e o patrimônio do antigo titular do cartório, quanto mais quando a fraude se deu no deveras longínquo ano de 1981, portanto, há mais de 34 anos”, destacou.
Por considerar que o estado também responde diante da dificuldade ou impedimento de se responsabilizar o tabelião ou notário causador do dano a terceiro, Buhatem votou por condenar o governo do Rio de Janeiro a pagar uma indenização de R$ 10 mil ao autor. A decisão foi por maioria, e cabe recurso.
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Processo 0198058-92.2010.8.19.0001
Fonte: ConJur
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