Pergunta do leitor: Tenho um meio-irmão, filho somente da minha mãe, que teria 25% dos bens dos meus pais. Há um tempo, meus pais deram um valor em dinheiro para este irmão, mas somente na condição de num futuro ele abrir mão dos 25% dele na casa atual dos meus pais, na qual também resido.
No entanto, não foi feito um documento com esta combinação, e hoje este meio irmão acha injusto somente eu ficar com a casa no futuro. Queremos comprar esses 25% dele, com contrato. É possível?
Resposta de Samir Choaib* e Helena Rippel Araujo:
A doação dos seus pais ao seu irmão precisaria ter sido formalizada (contrato de doação) e constado no contrato que tratava-se de doação feita em adiantamento de “legítima”, de forma que no futuro inventário dos seus pais, este adiantamento fosse “contabilizado” e então você pudesse ser compensado.
O indicado é que este contrato seja feito neste momento, porém mencionando a data efetiva em que foi feita a doação, com assinaturas dos doadores, do donatário e menção ao recolhimento do imposto de doação (ITCMD) devido pelo donatário ao Estado de domicílio do doador. Caso não tenha sido recolhido o ITCMD, será devido na data de hoje com multa e juros desde a doação.
A depender do valor da doação, pode estar isenta do ITCMD, o que deve ser verificado na legislação do Estado competente. A operação precisará ser reportada nas Declarações de Imposto de Renda Pessoas Físicas dos envolvidos, referentes ao ano da doação (são passíveis de retificação as declarações de até 5 anos atrás).Caso não seja possível formalizar, então a ocorrência da doação será matéria de prova.
Sobre a compra de direitos hereditários do seu irmão (25% da casa), cogitada acima, tais direitos não podem ser objeto de contrato, pois qualquer transação sobre herança de pessoa viva é vedada pela legislação brasileira.
A venda direta do bem dos seus pais a você, por outro lado, pode ser feita; porém, dependerá do consentimento e assinatura do seu meio-irmão e da efetiva movimentação financeira (pagamento do valor estipulado por você a eles).
O seu meio-irmão é herdeiro da sua mãe, mas não do seu pai. Assim, em linhas gerais, após o falecimento dos seus pais, considerando o casamento deles em comunhão universal de bens, 100% da herança do casal será dividida 75% para você e 25% para o seu meio-irmão.
Nada impede que, numa situação de recusa do seu irmão em cumprir o combinado, e se assim for o desejo de seus pais, eles disponham sobre 50% do patrimônio total deles unicamente em seu favor (a chamada “parcela disponível”), desde já por doação, ou por herança (através de testamento).
Doam ou destinam através de herança o imóvel a você, sendo que somente será possível destinar a integralidade do bem a você se este corresponder a até 50% do valor total do patrimônio deles (sobre o restante não podem dispor, o que configuraria lesão ao direito do seu co-irmão).
Se o bem imóvel corresponder a mais de 50% do patrimônio do casal, então eles poderão doar ou dispor em testamento à você somente sobre uma parte do imóvel, destinando, assim, a maior parte possível. Para doação ou testamento não há necessidade da participação do seu irmão.
*Samir Choaib é advogado e economista formado pela Universidade Mackenzie e pós-graduado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). É sócio do escritório Choaib, Paiva e Justo, Advogados Associados e responsável pela área de planejamento sucessório do escritório.
Fonte: Exame