Na manhã desta sexta-feira (17/02) o presidente da Seção de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), desembargador Ricardo Henry Marques Dip, ministrou, no Fórum de Guarulhos I - (Dr. Murilo Matos Faria) palestra sobre o tema “A Desconstrução do Registro Civil”. No total, 149 pessoas, entre juristas e registradores, estiveram presentes para prestigiar a aula do magistrado, que teve transmissão ao vivo pela página do facebook da Arpen-SP.
O desembargador iniciou sua apresentação com uma frase direta: “O Registro Civil é a bola da vez”, justificando-a pelo fato de que a atividade está sendo efetivamente asfixiada em suas perspectivas funcional, institucional e econômica. “A funcional é resumida num problema interessante do ponto de vista atual, que trata da anarquia de suas funções. Em suma, quando a ordem não é obedecida, há fusão de funções e, inevitavelmente, confusão”, explicou
“Por exemplo: ao atribuir a um registrador de imóveis o dever de reconhecer firma em balcão ou, a um notário, a expedir títulos judiciais, cria-se um estado de desordem nas coisas, pois quando um notário passa a expedir os títulos como as tais cartas notariais de sentença, hoje é aceitável, mas vamos ver daqui alguns anos os resultados, quando os tribunais passarem a recusar o cumprimento destas cartas anômalas, que resultam no segundo ponto de vista, que é a institucional”, ressaltou Dip.
Sobre a perspectiva econômica, o desembargador destacou que “as perversões deste sistema desordenado é agravado pela criação das gratuidades de atos essenciais para a cidadania, mas que tenta ser aquietado pelo que que chamo de ‘bolsa-registro’ e explano falando que, com esta renda mínima geral para os cartórios, ao final do mês, melhor será para o registrador que nenhum ato tenha sido praticado no registro civil, pois assim ele receberá esta bolsa-esmola, o que acho de muito mal gosto, pois registrador não pode receber esmola, sem ter dispendido absolutamente nada, e isso acaba, infelizmente, fomentando a inatividade”, disse, finalizando que, por esta razão, os registradores civis sofrem uma desumana moléstia de um sistema absolutamente incorreto, asfixiando-os economicamente e estimulando a baixa produtividade, o que, segundo seu ponto de vista, é ruim para todos os lados.
Após ter destrinchado a desconstrução do registro civil por meio de três perspectivas, o desembargador alertou sobre a criação do “registrão”, uma base de dados gerenciada pelo governo através do Sistema Nacional de Informações de Registro Civil (SIRC), fazendo uma analogia com o livro 1984, de George Orwell. “Não apenas pensando em mim, mas nos meus netos e bisnetos e em boa parte dos presentes neste auditório, objetivo uma perspectiva muito sombria para o que hoje chamamos de liberdade, pois se as coisas continuarem assim, centralizando todas as informações da vida das pessoas para o ‘Grande Irmão’, será instaurada uma democracia totalitária”, indagou.
Ricardo Dip concluiu sua palestra instigando os presentes a se conscientizarem sobre estes perigos. “Vamos nos acomodar e deixar que as coisas continuem ocorrendo do jeito que estão? As armas estão lançadas, ou vamos no caminho da verdade, do bem, ou deixaremos nos levar pelos erros que vão desconstruindo a comunidade, culminando na barbárie da desconstrução do registro civil? Não serei eu a responder esta questão, pois ela está no coração de cada um dos senhores”.
Vários oficiais de registro civil do Estado de São Paulo prestigiaram a palestra. A Oficial de Registro Civil do cartório do 47º Subdistrito de São Paulo - Vila Guilherme, Érica Barbosa e Silva, destacou que a palestra do desembargador abriu uma nova perspectiva sobre a desconstrução do Registro Civil. “A questão da desconstrução do registro civil está muito ligada às gratuidades. Esta palestra foi fundamental para compreendermos este fenômeno um pouco melhor. Acredito que as gratuidades são concedidas sem as verificações das consequências e isso tem reflexos nefastos para nossa atividade. Esta palestra de hoje dissecou tudo o que a atividade já vem sofrendo, mas de uma outra perspectiva através dos argumentos do Dr. Dip”, falou.
Lucas Campos de Souza, juiz substituto da 44ª circunscrição judiciária em Guarulhos compareceu à reunião por compactuar com as ideias do desembargador, mesmo não sendo da atividade extrajudicial. “Foi uma palestra interessante, pois há algum tempo já vinha me interessando sobre este tema (desconstrução do registro civil) e sobre como o trabalho dos registradores vem sendo alterados de uma maneira tão destoante da realidade. As palavras do desembargador foram muito esclarecedoras, pois refletem o meu pensamento sobre isso, de que os registros devem refletir realmente uma relação de ordem para a sociedade”. disse.
Fonte: Arpen SP