Além de terem perdido amigos, vizinhos e suas próprias casas, os moradores afetados pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG) perderam documentos pessoais básicos na lama de rejeitos: certidões de nascimento, casamento e carteiras de identidade. Agora, buscam refazê-los para dar prosseguimento a trâmites burocráticos.
Uma das regiões mais atingidas pelo rompimento da barragem foi o bairro Parque da Cachoeira. Nesta terça-feira (5), o Sindicato dos Oficiais de Registro Civil de Minas Gerais e a Polícia Civil realizaram um mutirão no local para a confecção da segunda via dos documentos.
Uma atendente do sindicato estimou que pelo menos 40 pessoas afetadas pela tragédia já procuraram o serviço desde a semana passada. A entidade ficou responsável pela intermediação com cartórios do estado para a emissão de certidões de nascimento, casamento e óbito — neste último caso, sem ligação com o rompimento.
Se o registro estiver no cartório de Brumadinho, a certidão fica pronta no dia seguinte ao pedido. Caso contrário, pode levar mais alguns dias.
Já a Polícia Civil cuidou da impressão das novas identidades. Se em posse dos documentos exigidos, o morador saía com a carteira na hora.
Adélia de Oliveira morava na parte baixa do Parque da Cachoeira e estava em casa com um dos filhos no último dia 25 quando ouviu um estrondo — era a barragem se rompendo. Uma filha de Adélia, com crianças de dois e três anos, também conseguiu se salvar, embora a residência tenha ficado destruída.
“O barro já estava quase chegando perto de nós. Nós saímos correndo só com a roupa do corpo. [A lama] levou tudo, tudo. Documento, roupa, casa, carro. Dos meus outros filhos, dos meus vizinhos. Meu marido perdeu as ferramentas pra trabalhar. Ele é pedreiro”, falou. “Graças a Deus saiu todo mundo vivo. É o mais importante.”.
Adélia precisará tirar novas certidões de nascimento, casamento e carteira de identidade. A previsão é que fiquem prontas nesta terça. “Agora é irrigar a vida daqui pra frente. Deus está no controle de tudo”, afirmou.
Outra presente ao mutirão era a funcionária da prefeitura de Brumadinho, Ivanilda Prado. Ela também teve casa, carro e pertences destruídos pelos rejeitos.
Ivanilda contou que estava trabalhando no momento da queda da barragem e ficou apenas com a roupa do corpo: a blusa do uniforme, uma legging e uma botina. Um de seus filhos, de 19 anos, que estava em casa, conseguiu se salvar ao ser chamado por uma vizinha.
“Acabou tudo, tudo. Meu filho disse que, quando olhou para trás, já não tinha sobrado mais nada. Eu fui lá depois. Embaixo da minha casa tinha umas outras 15. Agora você não vê nem o telhado delas”, relatou. “Não perdi ninguém da família, mas a dor é a mesma. Perdi amigos de infância.”
A reportagem presenciou outras famílias cujas casas foram levadas pela lama reavendo a documentação. Abaladas, preferiram não conversar.
No mutirão, houve ainda atendimento médico e psicológico. Para entreter as crianças do bairro, o Sesc (Serviço Social do Comércio) levou brinquedos, como piscina de bolinhas, e organizou partidas de futebol.
Fonte: UOL